Adriano Gonçalves
segunda-feira, 2 de setembro de 2024
Filme Lucy
quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024
O Mito dos Cavalos Alados
Vou escrever um pouco sobre a
natureza da alma, dentro do contexto do diálogo platónico Fedro. Platão na sua obra
Fedro, descreve um diálogo que houve entre Sócrates e Fedro. Embora os temas
debatidos neste diálogo sejam essencialmente o amor e a retórica, vou-me cingir
apenas à questão da alma, abordada também nesta obra através do conhecido Mito
da Parelha Alada. Nesta alegoria, Platão faz uma reflexão sobre o que é a
alma e qual a sua natureza. A primeira ideia é que a alma é imortal e indestrutível,
transcende à matéria, não nasce nem morre, porque a alma é o princípio de tudo e
como é um princípio não pode ser gerado, senão deixa de ser um princípio. A
segunda opinião é sobre o dualismo, para tudo o que existe há sempre um oposto.
Na abordagem da alma, existe o mundo sensível que é o mundo que observamos
através dos cinco sentidos, e o seu oposto é o mundo das ideias (céu) constituído
de coisas não observáveis, onde existe tudo o que nós conhecemos, mas de forma
imaterial, imutável e perfeita. O mundo sensível é uma cópia imperfeita (por
vezes demasiado imperfeita) do original que existe no mundo das ideias. Entre
esses dois mundos existe um espaço onde andam as almas dos Deuses que são aquelas
que já atingiram a perfeição e as outras que ainda estão a passar por provações
para evoluir. Das que ainda estão a passar por provações, muitas vão encarnar num
corpo humano. Platão escreveu que o seu mestre Sócrates, para melhor explicar a
Fedro o seu pensamento sobre alma e como é que a consciência humana pode lidar
com os elementos que a constituem, criou o Mito dos Cavalos Alados. O Mito
divide a alma em três partes e começa a ser explicado da seguinte maneira: a alma
pode ser comparada com uma parelha alada, constituída por uma biga (carruagem)com
dois cavalos alados (cavalos voadores) conduzida por um Auriga (cocheiro). O Auriga
é a parte que representa o intelecto, a razão, sendo ele que controla e tenta
harmonizar os dois cavalos. As outras duas partes são representadas pelos cavalos,
sendo que um cavalo é o bom e representa o impulso racional da alma, a parte
positiva da paixão, e o outro é o cavalo mau, que representa a parte instintiva
da alma, ou seja, a parte das paixões e dos desejos irracionais. Ambos os cavalos
têm uma coisa em comum, amam as coisas belas. O cavalo bom é branco e belo é
amigo da opinião certa não precisa de ser esporeado pois basta para o fazer
trotar uma palavra de comando ou de encorajamento, ele olha para o mundo das
ideias (céu) comtemplando toda a beleza que lá existe. O cavalo mau tem um aspeto
feio, é amigo da soberba e da lascívia, não obedece a ordens e a muito custo
obedeceu, depois de castigado com açoites, fica olhando para baixo contemplando
as belezas terrenas, e ao contrário do cavalo bom que se contenta em contemplar,
tenta possuir tudo o que é belo, foçando a carruagem para baixo. para o mundo
material. E assim anda a alma a vagar pelo espaço, e o cocheiro a tentar
equilibrar uma carruagem com dois cavalos que querem estar em lugares
diferentes. Nesta indecisão a carruagem por vezes fica descontrolada e cai na
terra, os cavalos perdem as asas e a alma fica habitando um corpo para passar
pela experiência dos sentidos. Este é o sinal de que o cavalo mau venceu. Todos
os que habitamos a terra pertencemos às almas em que a parte má da alma venceu.
As nossas Asas que estão partidas vão ter de voltar a crescer para voltar a
voar e levar a alma novamente para a luminosidade. Para que as asas voltem a
crescer os cavalos têm de ser bem alimentados e os bons alimentos segundo Platão,
são a beleza, a sabedoria a justiça e as virtudes. Para isso o cocheiro tem de
ser mais habilidoso para conseguir harmonizar os dois cavalos, uma vez que não
podemos negar nenhum deles, pois os dois são necessários, só que têm de estar
em harmonia e bem alimentados. O problema é que são muitos os incentivos para o
mau alimento, é muito o lixo que entra na nossa mente das mais variadas formas
e isso impede a nossa evolução espiritual. Muitos de nós vão precisar de muitas
reencarnações até que as asas cresçam e a alma possa voltar a voar. Constantemente
sou puxado violentamente pelo cavalo mau e por vezes continuo a ser um mau
cocheiro e não o consigo controlar os cavalos e a minha carruagem (minha vida)
vai no rumo errado. Mas o facto de conhecer este mito tem-me ajudado a refletir
e nos momentos menos bons, digo sempre para mim mesmo, lá está o cavalo mau a
dominar e isso permite-me ir em busca do equilíbrio. Se alguém ao ler esta
minha divagação sinta a curiosidade de explorar este mito e o ajudar a
conhecer-se melhor, valeu a pena mais esta divulgação. Mas se ninguém ler,
também valeu a pena, porque enquanto o escrevia fiz várias reflexões positivas
para mim mesmo.
Adriano
quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024
Continuando a ler O POETA
Publico pequenos retalhos de alguns escritos
de Fernando Pessoa. São pérolas que o pensamento brota. Embora eu escreva para
mim, fico feliz se alguém tropeçar neste blogue e ao ler um pouco do que
transcrevi, desperte a curiosidade para explorar o poeta mais profundamente.
E Exerto1
E
Sou um guardador de
rebanhos, o rebanho é os meus pensamentos e os meus
pensamentos são todos sensações. Penso com os olhos e com os ouvidos, e com as mãos e
os pés, e com o nariz e a boca.
Pensar uma
flor é vê-la e cheirá-la, e comer um fruto é saber-lhe o sentido. Por isso quando
num dia de calor me sinto triste de gozá-lo tanto, e me deito ao
comprido na erva, e fecho os olhos quentes, sinto todo o meu corpo deitado na
realidade, sei a verdade e sou feliz.
Exerto2
Se eu pudesse trincar a terra toda e sentir-lhe um paladar, e
se a terra fosse uma coisa para trincar, seria mais feliz um momento…Mas eu nem
sempre quero ser feliz, é preciso de vez em quando ser infeliz, para se poder ser natural…Nem tudo é dias de sol, e a
chuva, quando falta muito, pede-se. Por isso tomo a infelicidade com a Felicidade,
naturalmente, como quem não estranha que haja montanhas e planícies, e que haja
rochedos e erva.
Exerto3
Ah, não há saudades mais
dolorosas do que as das coisas que nunca foram!
Exerto4
Adoramos a perfeição
porque a não podemos ter, repugná-la-íamos se a tivéssemos. O perfeito é o
desumano, porque o humano é imperfeito.
Exeerto5
Agir, eis a inteligência
verdadeira. Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O êxito está em
querer ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem
qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se não o fizerem ali?
sexta-feira, 26 de janeiro de 2024
A Sabedoria do Poeta
Ler Fernando Pessoa ajuda-nos a perceber a vida. Publico pequenos excertos de alguns dos seus poemas que me têm ajudado a refinar o meu modo de pensar. Alterei a estrutura da escrita poética para diminuir o tamanho do texto. São mensagens com muita metafísica e que exigem uma profunda reflexão em cada frase. Não vou comentar a minha análise sobre cada excerto, porque como diz a frase: "Quem não compreende um olhar, tampouco compreenderá uma longa explicação".
Excerto 1
Da minha aldeia vejo o quanto se pode ver o Universo. Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer, porque eu sou do tamanho do que vejo e não do tamanho da minha altura. Nas cidades a vida é mais pequena que aqui na minha casa no cimo deste outeiro. Nas cidades as grandes casas fecham a vista à chave, escondem o horizonte, empurram nosso olhar para longe de todo o céu. Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos podem dar e tornam-nos pobres porque a única riqueza é ver.
Excerto2
Para além da curva da estrada talvez haja um poço e talvez haja um castelo, ou talvez apenas a continuação da estrada. Não sei nem pergunto. Enquanto vou na estrada antes da curva só olho para a estrada antes da curva, porque não posso ver senão a estrada antes da curva. De nada me serviria estar olhando para outro lado e para aquilo que não vejo. importemo-nos apenas com o lugar onde estamos, há beleza bastante em estar aqui e não noutra parte qualquer. Se há alguém para além da curva da estrada, esses que se preocupem com o que há para além da curva da estrada, essa é que é a estrada para eles. Se nós tivermos que chegar lá, quando lá chegarmos saberemos. Por ora só sabemos que lá não estamos. Aqui há a estrada antes da curva e antes da curva há a estrada sem curva nenhuma.
Excerto3
Quando vier a primavera, se eu já estiver morto, as flores florirão da mesma maneira e as árvores não serão menos verdes que na primavera passada. A realidade não precisa de mim. Sinto uma alegria enorme ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma. Se soubesse que amanhã morria e a primavera era depois de amanhã, morreria contente, porque ela era depois de amanhã. Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir se não no seu tempo? Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo, e gosto porque assim seria mesmo que eu não gostasse. Por isso, se morrer agora, morro contente, porque tudo é real e tudo está certo. Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem. Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele. Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências. O que for, quando for, é que será o que é.