quinta-feira, 29 de agosto de 2019

O Sermão


O sermão de Stº António aos peixes, proferido pelo Padre António Vieira em São Luís do Maranhão a 13 de junho de 1654, é uma alegoria intemporal, a sua voz fez um eco que se ouve até os dias de hoje. Neste sermão serviu-se da alegoria e, pregando aos peixes, tentou sensibilizar a consciência humana. Começou o sermão referindo que Stº António, quando pregava em Itália na cidade de Arímino contra os hereges,  vendo que as suas palavras não eram bem recebidas e pouco faltando para lhe tirarem a vida, não deixou de pregar, simplesmente mudou de  púlpito e de auditório, ”já que não me querem ouvir os homens, ouçam-me os peixes”, deixou as praças e foi para as praias pregar aos peixes. Estando o Padre Vieira, numa situação análoga à de Stº António e encontrando-se perto do mar, fez como o santo e pregou aos peixes. Destacou as virtudes dos peixes em geral e enalteceu de sobremaneira quatro deles. Criticou-os também de forma global, relativamente à sua ignorância, vaidade, cegueira e más condutas e, por se comerem uns aos outros, com a agravante de serem sempre os maiores a comerem os mais pequenos, explorando e humilhando os mais desfavorecidos. Também na crítica escolheu quatro peixes que por fazerem lembrar a hipocrisia e mesquinhez dos homens, mereceram uma crítica mais profunda. Embora o sermão fosse sobre as atrocidades que os sanguinários colonos portugueses infligiam aos nativos, o tema continua atual, porque continuamos a viver num Mundo onde grande parte da população continua a ser explorada por alguns que dominados pela ganância, o muito é insuficiente. Deveríamos ler e meditar Vieira pelo conteúdo moralista e pela escrita de rara beleza. Fernando Pessoa escreveu que Vieira era o “imperador da língua portuguesa”. Atualmente na situação de emergência ecológica que vivemos e não querendo os homens ouvirem os que tentam salvar a humanidade e o planeta, será que temos de voltar a pregar aos peixes para que os homens nos oiçam? Nunca houve no Mundo gente tão inculta com poder para fazer tanto mal. Dois exemplos de incultura: Bolsonaro presidente do Brasil, respondendo a um jornalista como resolver o problema ambiental: “é só você fazer cocó, dia sim dia não”. Trump no seu discurso do dia da independência diz que o exército americano havia conseguido “tomar o controlo dos aeroportos “contra os britânicos em 1775, o avião só foi inventado um século depois. Sim, já tivemos Hitler, Mao, Estaline, Pinochet, guerras mundiais, genocídios, mas não aprendemos nada com isso? Falemos aos peixes para enaltecer aqueles que lutam por uma humanidade mais humana e criticar os que desrespeitam a criação. O dia da sobrecarga do planeta deste ano foi a 29 de julho, a data mais recuada desde que o défice ecológico começou no ano 1970. As grandes potências “esfregam as mãos” de contentes com o degelo do Ártico, veem mais uma oportunidade de faturar milhões, não conseguem ver que o degelo poderá afetar negativamente o mundo de forma irreversível. Gaudí disse: “A originalidade consiste no retorno à origem; assim, original é aquele que retorna à simplicidade das primeiras soluções”. Aprendamos!