No filme de ficção
Lucy, numa preleção e baseando-se no mito de que o ser humano só utiliza cerca
de 10% da sua capacidade cerebral, o professor Norman (interpretado por Morgan
Freeman) salienta o caso do único ser vivo que usa o cérebro melhor do que o
ser humano, o golfinho. Diz o professor Norman que: “estima-se que esse incrível
animal use até 20% da sua capacidade cerebral, isso permite que ele tenha um sistema
de ecolocalização mais eficiente do que qualquer sonar inventado pelo homem. Mas
o golfinho não inventou o sonar, ele o desenvolveu naturalmente, essa é a parte
crucial da nossa reflexão filosófica, poderíamos então concluir que: os humanos
estão mais preocupados em ter do que ser”. Eu penso que não devemos
desassociar o ter do ser, mas é importante o equilíbrio entre estes dois
vetores. Vivemos numa sociedade de consumismo, promovida de forma
agressiva pela comunicação social. As pessoas são avaliadas muito mais pelo que
têm do que pelo que são, concomitantemente, isso cria um vazio existencial.
Para preencher esse vazio, a propaganda consumista induz-nos a comprar coisas,
muitas delas desnecessárias. Os últimos modelos de telemóvel, tablet, televisão,
computador e uma infinidade de gadgets, sempre com inovações que nos tornam
incompletos se não os possuímos. Quem leu “A Cidade e As Serras” de Eça de
Queiroz, vê lá tudo isto bem explanado. Tal como no romance de Eça, o vazio
nunca é preenchido, exatamente porque o vazio não existe, é uma criação da
mente racional, uma ilusão que rapidamente passa. O homem, a natureza e o
Universo são só um, dividimos parte do DNA com plantas e animais, todos somos
feitos de átomos, e do que temos conhecimento, tudo o que existe no Universo é
feito do mesmo material, a falta de compreensão destes aspetos é o que provoca
o vazio. O estilo de vida que vivemos com fabulosos avanços tecnológicos, tem
atrasado o desenvolvimento das nossas capacidades intrínsecas, coisas que
poderíamos fazer sem dificuldade com os nossos meios naturais, hoje dependemos
de tecnologia para executar esses procedimentos. O filme de ficção Lucy, tenta
que façamos uma reflexão sobre o que aconteceria se conseguíssemos usar 100% do
nosso cérebro, se um dia pudéssemos atingir o nível de compreensão que a Lucy
atingiu através da droga. Para entendermos melhor o filme, é importante
sabermos que Lucy foi o nome dado ao fóssil fêmea descoberto em 1974, e que é o
fóssil mais antigo visto até hoje, 3,2 milhões de anos. A título de curiosidade
este nome foi dado em homenagem à música dos Beatles “Lucy in the Sky With
Diamonds”. Para melhor compreensão desta obra também facilita termos breves
noções sobre Kant, Schopenhauer, Einstein e física quântica. Analisando o
conteúdo do filme e se acreditarmos que somos feitos de átomos organizados e
imaginarmos esses átomos colocados tipo legos, é fácil perceber que se através
da nossa capacidade mental conseguirmos alterar a organização dos átomos,
podemos nos transformar em outras coisas. A física quântica prova que nada é
sólido, tudo é energia e informação. O nosso cérebro é ainda um universo por
explorar, e se o utilizarmos em equilíbrio entre o desenvolvimento pessoal e o
tecnológico, daremos um grande passo na nossa evolução. Neste filme tal como em
Matrix1, temos de nos aliar dos tiros e das peripécias e nos concentrarmos na
mensagem filosófica. Termino com uma frase do Millôr Fernandes, que faço
questão de não esquecer “É importante ter, sem que o ter te tenha” esta
frase alerta-me constantemente para manter o meu equilíbrio entre a mente o espírito
e os bens materiais, percebendo que os bens materiais têm valor, mas não devem
dominar a minha vida.
Adriano Gonçalves